Ílhavo, 22 de Outubro de 2007
Senhor Presidente da República Portuguesa
Excelência:
Disse V. Excia, no discurso do passado dia 5 de Outubro, que os
professores precisavam de ser dignificados e eu ouso acrescentar: "Talvez V.
Excia não saiba bem quanto!"
1. Sou professor há mais de trinta e seis anos e no ano passado
tive o primeiro contacto com a maior mentira e o maior engano (não lhe chamo
fraude porque talvez lhe falte a "má-fé") do ensino em Portugal que dá pelo
nome de Cursos de Educação e Formação (CEF).
A mentira começa logo no facto de dois anos nestes cursos darem
equivalência ao 9º ano, isto é, aldrabando a Matemática, dois é igual a
três!
Um aluno pode faltar dez, vinte, trinta vezes a uma ou a várias
disciplinas (mesmo estando na escola) mas, com aulas de remediação, de
recuperação ou de compensação (chamem-lhe o que quiserem mas serão sempre
sucedâneos de aulas e nunca aulas verdadeiras como as outras) fica sem
faltas. Pode ter cinco, dez ou quinze faltas disciplinares, pode inclusive
ter sido suspenso que no fim do ano fica sem faltas, fica puro e imaculado
como se nascesse nesse momento.
Qual é a mensagem que o aluno retira deste procedimento? Que pode
fazer tudo o que lhe apetecer que no final da ano desce sobre ele uma luz
divina que o purifica ao contrário do que na vida acontece. Como se vê
claramente não pode haver melhor incentivo à irresponsabilidade do que este.
2. Actualmente sinto vergonha de ser professor porque muitos alunos
podem este ano encontrar-me na rua e dizerem: "Lá vai o palerma que se
fartou de me dizer para me portar bem, que me dizia que podia reprovar por
faltas e, afinal, não me aconteceu nada disso. Grande estúpido!"
3. É muito fácil falar de alunos problemáticos a partir dos
gabinetes mas a distância que vai deles até às salas de aula é abissal. E
é-o porque quando os responsáveis aparecem numa escola levam atrás de si (ou
à sua frente, tanto faz) um magote de televisões e de jornais que se
atropelam uns aos outros. Deviam era aparecer nas escolas sem avisar, sem
jornalistas, trazer o seu carro particular e não terem lugar para estacionar
como acontece na minha escola.
Quando aparecem fazem-no com crianças escolhidas e pagas por uma
empresa de casting para ficarem bonitos (as crianças e os governantes) na
televisão.
Os nossos alunos não são recrutados dessa maneira, não são louros,
não têm caracóis no cabelo nem vestem roupa de marca.
Os nossos alunos entram na sala de aula aos berros e aos
encontrões, trazem vestidas camisolas interiores cavadas, cheiram a suor e a
outras coisas e têm os dentes em mísero estado.
Os nossos alunos estão em estado bruto, estão tal e qual a Natureza
os fez, cresceram como silvas que nunca viram uma tesoura de poda. Apesar de
terem 15/16 anos parece que nunca conviveram com gente civilizada.
Não fazem distinção entre o recreio e o interior da sala de aula
onde entram de boné na cabeça, headphones nos ouvidos continuando as
conversas que traziam do recreio.
Os nossos alunos entram na sala, sentam-se na cadeira, abrem as
pernas, deixam-se escorregar pela cadeira abaixo e não trazem nem
esferográfica nem uma folha de papel onde possam escrever seja o que for.
Quando lhes digo para se sentarem direitos, para se desencostarem
da parede, para não se virarem para trás olham-me de soslaio como que a
dizer "Olha-me este!" e passados alguns segundos estão com as mesmas
atitudes.
4. Eu não quero alunos perfeitos. Eu quero apenas alunos normais!!!
Alunos que ao serem repreendidos não contradigam o que eu disse
e que ao serem novamente chamados à razão não voltem a responder querendo
ter a última palavra desafiando a minha autoridade, não me respeitando nem
como pessoa mais velha nem como professor. Se nunca tive de aturar faltas de
educação aos meus filhos por que é que hei-de aturar faltas de educação aos
filhos dos outros? O Estado paga-me para ensinar os alunos, para os educar e
ajudar a crescer; não me paga para os aturar! Quem vai conseguir dar aulas a
alunos destes até aos 65 anos de idade?
Actualmente só vai para professor quem não está no seu juízo
perfeito mas se o estiver, em cinco anos (ou cinco meses bastarão?...) os
alunos se encarregarão de lhe arruinar completamente a sanidade mental.
Eu quero alunos que não falem todos ao mesmo tempo sobre coisas que
não têm nada a ver com as aulas e quando peço a um que se cale ele não me
responda: "Por que é que me mandou calar a mim? Não vê os outros também a
falar?"
Eu quero alunos que não façam comentários despropositados de modo a
que os outros se riam e respondam ao que eles disseram ateando o rastilho da
balbúrdia em que ninguém se entende.
Eu quero alunos que não me obriguem a repetir em todas as aulas
"Entram, sentam-se e calam-se!"
Eu quero alunos que não usem artes de ventríloquo para assobiar,
cantar, grunhir, mugir, roncar e emitir outros sons. É claro que se eu não
quisesse dar mais aula bastaria perguntar quem tinha sido e não sairia mais
dali pois ninguém assumiria a responsabilidade.
Eu quero alunos que não desconheçam a existência de expressões como
"obrigado", "por favor" e "desculpe" e que as usem sempre que o seu emprego
se justifique.
Eu quero alunos que ao serem chamados a participar na aula não me
olhem com enfado dizendo interiormente "Mas o que é que este quer agora?" e
demorem uma eternidade a disponibilizar-se para a tarefa como se me
estivessem a fazer um grande favor. Que fique bem claro que os alunos não me
fazem favor nenhum em estarem na aula e a portarem-se bem.
Eu quero alunos que não estejam constantemente a receber e a enviar
mensagens por telemóvel e a recusarem-se a entregar-mo quando lho peço para
terminar esse contacto com o exterior pois esse aluno "não está na sala",
está com a cabeça em outros mundos.
Eu sou um trabalhador como outro qualquer e como tal exijo
condições de trabalho! Ora, como é que eu posso construir uma frase
coerente, como é que eu posso escolher as palavras certas para ser claro e
convincente se vejo um aluno a balouçar-se na cadeira, outro virado para
trás a rir-se, outro a mexer no telemóvel e outro com a cabeça pousada na
mesa a querer dormir?
Quando as aulas são apoiadas por fichas de trabalho gostaria que os
alunos, ao sair da sala, não as amarrotassem e deitassem no cesto do lixo
mesmo à minha frente ou não as deixassem "esquecidas" em cima da mesa.
Nos últimos cinco minutos de uma aula disse aos alunos que se
aproximassem da secretária pois iria fazer uma experiência ilustrando o que
tinha sido explicado e eles puseram os bonés na cabeça, as mochilas às
costas e encaminharam-se todos em grande conversa para a porta da sala à
espera que tocasse. Disse-lhes: "Meus meninos, a aula ainda não acabou!
Cheguem-se aqui para verem a experiência!" mas nenhum deles se moveu um
milímetro!!!
Como é possível, com alunos destes, criar a empatia necessária para
uma aula bem sucedida?
É por estas e por outras que eu NÃO ADMITO A NINGUÉM, RIGOROSAMENTE
A NINGUÉM, que ouse pensar, insinuar ou dizer que se os meus alunos não
aprendem a culpa é minha!!!
5. No ano passado tive uma turma do 10º ano dum curso profissional
em que um aluno, para resolver um problema no quadro, tinha de multiplicar
0,5 por 2 e este virou-se para os colegas a perguntar quem tinha uma máquina
de calcular!!! No mesmo dia e na mesma turma outro aluno também pediu uma
máquina de calcular para dividir 25,6 por 1.
Estes alunos podem não saber efectuar estas operações sem máquina e
talvez tenham esse direito. O que não se pode é dizer que são alunos de uma
turma do 10º ano!!!
Com este tipo de qualificação dada aos alunos não me admira que,
daqui a dois ou três anos, estejamos à frente de todos os países europeus e
do resto do mundo. Talvez estejamos só que os alunos continuarão a ser
brutos, burros, ignorantes e desqualificados mas com um diploma!!!
6. São estes os alunos que, ao regressarem à escola, tanto orgulho
dão ao Governo. Só que ninguém diz que os Cursos de Educação e Formação são
enormes ecopontos (não sejamos hipócritas nem tenhamos medo das palavras)
onde desaguam os alunos das mais diversas proveniências e com histórias de
vida escolar e familiar de arrepiar desde várias repetências e inúmeras
faltas disciplinares até famílias irresponsáveis.
Para os que têm traumas, doenças, carências, limitações e
dificuldades várias há médicos, psicólogos, assistentes sociais e outros
técnicos, em quantidade suficiente, para os ajudar e complementar o trabalho
dos professores?
Há alunos que têm o sublime descaramento de dizer que não andam na
escola para estudar mas para "tirar o 9º ano".
Outros há que, simplesmente, não sabem o que andam a fazer na
escola...
E, por último, existem os que se passeiam na escola só para
boicotar as aulas e para infernizar a vida aos professores. Quem é que
consegue ensinar seja o que for a alunos destes? E por que é que eu tenho de
os aturar numa sala de aula durante períodos de noventa e de quarenta e
cinco minutos por semana durante um ano lectivo? A troco de quê? Da gratidão
da sociedade e do reconhecimento e do apreço do Ministério não é, de certeza
absoluta!
7. Eu desafio seja quem for do Ministério da Educação (ou de outra
área da sociedade) a enfrentar ( o verbo é mesmo esse, "enfrentar", já que
de uma luta se trata...), durante uma semana apenas, uma turma destas
sozinho, sem jornalistas nem guarda-costas, e cumprir um horário de
professor tentando ensinar um assunto qualquer de uma unidade didáctica do
programa escolar.
Eu quero saber se ao fim dessa semana esse ilustre voluntário ainda
estará com vontade de continuar. E não me digam que isto é demagogia porque
demagogia é falar das coisas sem as conhecer e a realidade escolar está numa
sala de aula com alunos de carne, osso e odores e não num gabinete onde
esses alunos são números num mapa de estatística e eu sei perfeitamente que
o que o Governo quer são números para esse mapa, quer os alunos saibam estar
sentados numa cadeira ou não (saber ler e explicar o que leram seria pedir
demasiado pois esse conhecimento justificaria equivalência, não ao 9º ano,
mas a um bacharelato...).
É preciso que o Ministério diga aos alunos que a aprendizagem exige
esforço, que aprender custa, que aprender "dói"! É preciso dizer aos alunos
que não basta andar na escola de telemóvel na mão para memorizar
conhecimentos, aprender técnicas e adoptar posturas e comportamentos
socialmente correctos.
Se V.Excia achar que eu sou pessimista e que estou a perder a
sensibilidade por estar em contacto diário com este tipo de jovens pergunte
a opinião de outros professores, indague junto das escolas, mande alguém
saber. Mas tenha cuidado porque estes cursos são uma mentira...
Permita-me discordar de V. Excia mas dizer que os professores têm
de ser dignificados é pouco, muito pouco mesmo...
Atenciosamente
Domingos Freire Cardoso
Professor de Ciências Físico-Químicas
Rua José António Vidal, nº 25 C
3830 - 203 ÍLHAVO
Thursday, November 22, 2007
Sunday, November 18, 2007
Saturday, November 3, 2007
I just had to keep it here
He talked a lot about the past and I gathered that he wanted to recover something, some idea of himself perhaps, that had gone into loving Daisy. His life had been confused and disordered since then, but if he could once return to a certain starting place and go over it all slowly, he could find out what that thing was.
Merda, hesit....
Cada dia te é dado uma só vez
E no redondo círculo da noite
Não existe piedade
Para aquele que hesita.
Mais tarde será tarde e já é tarde.
O tempo apaga tudo menos esse
Longo indelével rasto
Que o não-vivido deixa
SMBA
Mais crimes sobre as vítimas do caso Casa Pia
Do Público de hoje. Onde se pode ver que, para lá dos pedófilos, há mais criminosos relacionados com este processo. Como podemos calar esta violência sobre as vítimas!?
"Perícias podem afectar ritmo do julgamento da Casa Pia
03.11.2007, António Arnaldo Mesquita "Perícias podem afectar ritmo do julgamento da Casa Pia
A repetição das perícias para avaliar da credibilidade de testemunhas e eventuais vítimas pode afectar o andamento do julgamento do processo da Casa Pia, que tinha previsto o fim da fase de produção de prova para o final do ano, admitiu fonte judicial ontem contactada pelo PÚBLICO.
A decisão da juíza-presidente, Ana Peres, vai exigir a realização de novos exames, a elaboração de relatórios, que serão posteriormente notificados ao colectivo, à acusação e à defesa.
Quando os psicólogos tornarem pública a sua análise, não será de excluir que qualquer das partes, defesa ou acusação, venha a contestar as suas conclusões, abrindo-se uma fase de alegações e de contra-alegações. Esta eventual polémica terá um desfecho que pode ocorrer quando o colectivo tiver terminado a inquirição das testemunhas e pode implicar a reabertura da produção de prova.
Não está igualmente excluído que os alvos das novas perícias venham a repetir a posição que adoptaram há cerca de um ano, quando se recusaram a ver novamente avaliada a sua credibilidade e perfil pessoal. Esta atitude pode, igualmente, suscitar novas controvérsias e levar a defesa a impugnar aquela posição de recusa.
As suspeitas de abusos sexuais na Casa Pia foram tornadas públicas na comunicação social em Novembro de 2002. O Ministério Público iniciou as investigações, e o julgamento começou dois anos depois.
Foi em Novembro de 2002, na sequência de uma entrevista à jornalista do Expresso Felícia Cabrita, que se tornaram conhecidas as suspeitas de abusos na Casa Pia".
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